segunda-feira, abril 23, 2007

A Musa [Conto]

Adorava a musa, mais do que tudo, mais do que qualquer outra coisa. Depois de uma desastrada tentativa de declaração, acabou conseguindo, a muito custo, esquecê-la. Se apaixonou novamente e desta vez, com mais sorte, iniciou um romance com sua nova paixão. Porém, o tempo passou, sua nova paixão foi aos poucos esfriando.
Alguns anos depois, meio que de repente, meio que por acaso, volta a ter conversas aleatórias, via internet, com a sua musa (a antiga, não a nova paixão). Depois de sonhar que a namorava 1 ou 2 noites, o antigo fogo voltou a arder. Aos poucos foi aumentando sua relação, sairam juntos algumas vezes, mas sempre tinha algo que o incomodava. Após um período em que eles tinham grande intimidade, seguia-se um período em que sua musa o ignorava.
Depois de um tempo em que sua "intimidade online" estava no auge, falando com a musa de manhã, tarde e noite, chegando a trocar 300 linhas apenas em um desses períodos, foram juntos a um show. Ele bebeu, talvez mais do que devia, ela recusava bebidas. Queria a qualquer custo investir na musa, mas apenas conseguia fazer carícias de "amizade colorida" sem nunca tentar beijá-la. No fim da noite, deixa-a em casa e retorna para a sua, melancólico, deprimido, desesperado, sabendo que no dia seguinte ela estaria distante dele e assim permaneceria por alguns dias.
O que ele não esperava é que isso fosse durar tanto tempo. Dois meses depois do fato e a distância ainda existia, talvez até um pouco maior. Ele aprendeu a ignorá-la, sem falar nada com ela, mas ao mesmo tempo ficava olhando e monitorando continuamente cada vez que ela entrava ou saia em serviços de mensagem instantânea, quem estava online ao mesmo tempo, com quem ela poderia estar falando. Nos períodos em que ela estava offline, ficava imaginando se ela não teria, na realidade, o bloqueado e estaria naquele momento se divertindo conversando com outros homens.
Nas vezes que tentava falar com ela era recebido de forma rude, ou ignorado. Nas poucas vezes em que ela respondia, após muito tempo e de forma lacônica, era comum que saísse no meio da conversa, sem mesmo se despedir, em geral ignorando sua última mensagem.
Com isso, o amor pela musa foi juntando a uma raiva incontrolável, que não parava de crescer. Porque sua musa tinha comportamento tão promíscuo em diversas situações mas com ele era aquela frieza? Será que ela não percebia o quanto estava se humilhando com aquele comportamento, de vadia como muitas vezes ele a xingava em seus pensamentos.
Foi tornando-se cada vez atormentado, sentia que precisava possui-la, ainda que fosse contra sua vontade, ainda que fosse apenas uma vez, ainda que ele tivesse que encerrar a vida dele, dela, ou de ambos em seguida. E foi assim que arquitetou seu plano, o dia em que ela seria dele.
Uma ultima vez tentou convidá-la para jantar, mas teve seu convite recusado com grosseria e até mesmo requintes de crueldade por parte da musa. Dirigiu-se até sua casa e ficou esperando a hora que ela iria sair. Surpresa em vê-lo, cumprimentou-o e parecia visivelmente irritada por ele estar ali. Ele não se fez de rogado e convidou-a uma ultima vez para fazer algo juntos, o que foi recusado. Perdendo seu ultimo resquício de humanidade em relação a ela, sem perder seu amor incondicional, envolveu-a em um lenço com clorofórmio e, desacordada colocou-a em seu carro.
Em sua casa, amarrou-a e esperou pacientemente que ela acordasse, enquanto admirava o seu corpo lindo que tanto desejou. Sua adoração pela musa era tanto que nem mesmo percebia as estrias, as celulites e alguns quilinhos a mais que, sejamos justo, a musa tinha (embora, é claro, não fosse gorda e sem dúvida era razoavelmente atraente). Quando ela acordou, com um misto de ódio e carinho explicou que não era daquela forma que ele gostaria. Ele tinha imaginado aquilo sendo feito com afeto, com paixão, com ele se preocupando de toda a forma no prazer dela a ponto de se esquecer completamente de seu próprio. Como ela iria gostar daquilo pelo que ia sentir em suas pernas, seu interior. E ele iria gostar pelo que iria sentir em suas mãos, suas bocas e na imagem da musa se entregando a ele.
Em seguida, possuiu a musa de forma violenta, desejando realmente causar dor. Algumas vezes desistia, tentava consolá-la, porém a lembrança de tudo que ela havia feito, de toda dor que ela havia causado, era mais forte, e assim ele continuava até terminar seu ato. Após o êxtase, sentia-se desesperado com o que tinha acabado de fazer e não sabia como seri daqui para frente, não tinha pensado nisso ainda.
Num ultimo ato de amor louco e incondicional, levou-a ainda amarrada para a garagem fechada, deitou ao seu lado com as mãos carinhosamente postas sobre o corpo dela. Antes disso, tinha ligado o carro e amarrado o pedal do acelerado para o máximo. Em pouco tempo, os dois estariam mortos por asfixiação. Ele morria realizado mas ao mesmo tempo arrependido.