segunda-feira, março 06, 2006

Crônicas-->O Afeganistão Não é Aqui. Ou é?

Acordei hoje cedo e tomei um banho gelado e curto. O governo me proibiu de usar o chuveiro elétrico e, para completar, a água acabou no meio do banho - devido à falta de chuvas, estamos com problemas na cidade de São Paulo.


Depois do café, fui levar minha filha à faculdade, de carro - um modelo mais antigo, troquei por este o carro zero para evitar os seqüestros. Ela tem 22 anos e estuda à três quadras de casa, mas as mulheres não podem andar desacompanhadas nesse país devido ao alto índice de crimes sexuais.


Então, após duas horas de congestionamento (que são diários, mas hoje estava pior devido ao tiroteio ocorrido de manhã entre a polícia e uma quadrilha que controla a zona sul) cheguei à minha empresa, que fica a três quilômetros de minha residência. Se pudesse, iria a pé, chegaria mais rápido.


Entrando ao trabalho, meu chefe já estafa furioso pelo meu atraso - tínhamos uma reunião maracada. Ele dizia que nossos concorrentes estavam tomando nossos territórios e, nesse ritmo, em breve perderíamos a guerra. Tentei explicar-lhe que, apesar do crescimento da concorrência, nossa marca de animais de pelúcia ainda era lider. Não convenci, estava muito nervoso. Também, pudera. Na semana passada, durante uma briga entre dois grupos pela posse de alguns bairros, uma granada acabou explodindo no jardim de sua casa, arremessada por um traficante que possuía uma metralhadora de uso exclusivo do exército russo - "essa União Soviética com a mania de socialismo só traz problemas... se tivessem se rendido logo ao capitalismo norte-americano, isso nunca teria acontecido!" - dizia ele.


Chegando à casa, fui assistir aos dez minutos diários de TV que me são permitidos e descobri que no Afeganistão uma milícia chamada Talebã controla 90% do território, proibindo mulheres de sair de casa, e deixando a população sem água, comida e eletricidade. Ainda bem que moro no Brasil, um país pacífico.

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A Vitória da Idade Média

Uma coisa que impressiona e revolta é a influência da Igreja na vida das pessoas, especialmente em cidades pequenas, pobres e subdesenvolvidos. Estou agora em uma delas, com cerca de 80.000 habitantes, no interior de Minas Gerais.

Os habitantes, em sua maioria, seguem uma rotina muito bem definida (pelos padres). Todos vão às missas e, com muita hipocrisia, obrigam os filhos a fazerem o mesmo, além de colocá-los no catecismo (é assim que escreve?) para serem adestrados.

Conversando com algumas crianças, longe dos pais, elas nos confessam que odeiam isso. Fico pensando se isso traria uma solução a esse problema, com uma nova geração que pensasse independente mente. Por outro lado, enxergo também a triste possibilidade da hipocrisia vencer novamente da inteligência e essas crianças, no futuro, obriguem também seus filhos a ir à missa. Ou, como é moda hoje em dia, "comprem" os próprios filhos, oferecendo-lhes presentes em troca de suas mentes.

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O Fim Está Próximo

É o fim. Não, não! Calma, não é nada disso que você está pensando. Não estou dizendo que o mundo está acabando e não estou abrindo uma igreja, pedindo que todos depositem R$100,00 na minha conta para não serem castigados no dia do Juízo Final (no entanto, se alguém quiser depositar, prometo não ficar magoado). Na minha modesta opinião, o nosso planeta suportará a nossa destruição por um bom tempo ainda.

O que está chegando ao fim é a ONU. Enquanto os Estados Unidos procuram desculpas para atacar o Iraque, a organização fica cada vez mais desmoralizada. Atualmente, está em um beco sem saída: se disser que não há motivos para haver a guerra, os EUA a farão do mesmo jeito, e ficará claro para o mundo que o órgão não tem mais nenhum poder.

Se, ao contrário, o apoio à guerra contra o Iraque for dado, até os mais ingênuos perceberão que a ONU não tem nenhuma autonomia. É apenas uma organização que existe para enfeitar a maravilhosa democracia de nossa sociedade judaico-cristã ocidental e mostrar aos outros povos bárbaros do planeta que prezamos pelos interesses das minorias - desde que sejam os mesmos que os nossos.

Uma declaração que vi de um civil americano dizia, mais ou menos, assim: se o Hitler tivesse sido reprimido quando começou com as suas maldades, a segunda guerra mundial provavelmente não teria acontecido. A culpa seria, então, das potências européias da época que se omitiram, para não prejudicar a sua economia. Deste modo, seria preciso parar Saddam agora, a fim de que não se inicie uma terceira guerra mundial. Fiquei pensando sobre isso, o que o cidadão americano disse tem coerência. Mas, para sermos justos, devemos aplicar a mesma regra aos dois lados: será que se ninguém parar o Bush, não haverá em breve uma terceira guerra mundial?

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Uma rua meio suspeita

Rodrigo era uma daquelas pessoas que podiam ser chamadas de "média". Tinha um desempenho médio na escola quando pequeno, atualmente trabalha em uma função média. Casou-se com uma mulher mais ou menos bonita, teve filhos mais ou menos sadios e é mais ou menos feliz.

Até aí, nada de diferente, o mundo está repleto de pessoas médias. Quem não tem um lado médio? Até mesmo esse escritor, que escreve textos "mais ou menos". No entanto, a situação começou a mudar no final daquele verão. Um dia desses, quando Rodrigo saía de casa para o seu trabalho médio, notou que uma pessoa meio estranha, de estatura mediana estava em uma posição meio suspeita, na metade da rua de sua casa. O nosso personagem principal (agora, ele também já é meio seu) nem ligou, tirou o seu carro da garagem e, quando ia trancar o portão, foi surpreendido pelo sujeito:

- Parado aí, seu Rodrigo! Esta arma está carregada e pronta para ser usada, embora eu não pretenda. Mais um movimento e ela ganhará vida própria!

- Mas o q-que é isso? - perguntou Rodrigo assustado - Deve ser algum engano...

- Que engano, Rodrigo... eu sou macaco-velho, deixa esse tipo de conversa para os seus iniciantes..

- Que iniciantes? Eu não sei de nada! - disse Rodrigo, já suando frio - Socorro! Alguém me ajude! - gritou desesperadamente

- Seu Rodrigo... esperava algo melhor de sua pessoa... francamente, você acha que algum dos patetas de sua rua vai vir aqui? No máximo chamarão a polícia, mas o delegado já ta sabendo!

- Tá certo... - Rodrigo, ainda meio assustado, viu que não tinha outra escolha - e o que você quer de mim?

- Ora essa... porque outra razão eu viria aqui? O chefe quer a grana!

- Agora não dá para pagar, rapaz... a situação ta meio difícil... o meu salário mal dá para pagar as dívidas... minha casa ta meio velha, meu carro meio quebrado e eu não tenho meios de conseguir mais grana... Mas... Êpa! Peraí... que dinheiro?

- Rodrigo... semana passada... você saiu do bar e dormiu com a Rebeca... falou pro chefe que pagaria a dívida hoje... ele tá esperando!

- Que Rebeca? Semana passada eu tava meio bêbado... saí mais cedo e vim direto para casa! Fala uma coisa dessas aqui, se minha mulher não fosse meio surda ela te ouviria e meu casamento tava ferrado... Agora você foi longe demais, seu safado!

Depois de falar isso, Rodrigo abandonou sua meia calma e partiu para cima do sujeito... Lutou bravamente para tentar pegar o revólver, mas foi meio devagar. Mais tarde, todos da rua estavam assustados e inconformados com a tragédia... quem passasse pela rua, ainda poderia ouvir de algum vizinho:

- Coitado do Rodrigo... não o conhecia muito, mas ele era meio legal... Foi meio esquisita essa sua morte... bem que eu tenho avisado que essa rua está meio perigosa..


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Uma Noite Diferente

Chegou em casa do mesmo modo que fazia todos os dias. Abriu a porta e já deixou a maleta no chão, ali mesmo no cantinho. Enquanto caminhava, desabotoou o paletó e o largou no sofá. Entrando na cozinha, tirou a gravata e deixou-a sobre a mesa, desabotoando o colarinho.

Abriu então a geladeira, já sentando, e tirou uma garrafa de cerveja, que começou a beber direto do bico. Afinal, morava sozinho, podia se dar esses luxos. Entre um gole e outro, percebeu que havia algo diferente naquela cozinha. Não parecia mais a mesma em que ele havia tomado o seu café, na manha daquele dia.

Tentou, em vão, descobrir o que estaria causando aquela sensação. Seria o fogão? Não, ele não tinha fogão, nunca gostou de cozinhar. Insetos? Não... Aquelas baratas já estavam ali quando ele saiu -aliás, elas já tinham até nomes carinhosos. Aquela inquietação foi tomando forma dentro do nosso personagem (sem nome, a titulo de economia), que já estava irritado com aquilo tudo.

Provavelmente era o stress do trabalho,pensou. É óbvio que não tem nada de diferente nesta cozinha. Onde já se viu? Alguém entraria em seu apartamento e faria uma mudança apenas para deixa-lo confuso?
Decidiu tomar um banho para dar uma acalmada nos ânimos. Mas... Não é que o banheiro estava estranho? Os cremes, xampus, sabonetes eram os mesmos, mas alguma coisa estava diferente do banheiro em que ele se barbeou bem cedinho, antes mesmo do sol aparecer no horizonte.

Estaria ficando louco? Deixou o banho para lá e foi direto para o quarto. Seu objetivo era deitar na cama e ali ficar, até o amanhecer. Decidira, também, que iria entrar de olhos fechados, para não correr o risco de achar o quarto diferente. Como em seu quarto não havia muita coisa além da cama, consegui facilmente cumprir o seu objetivo.

Depois de algum tempo deitado, conseguiu finalmente compreender o que havia mudado: nada. Isso mesmo, nada mudava em sua vida, nunca. O seu cotidiano era tão medíocre que nunca sequer tinha reparado na sua própria casa. Morava ali ha treze anos e nunca havia mandado arrumar o buraco na parede que existia quando ele se mudou. O seu emprego, era o mesmo esse tempo todo, nem ele sabia dizer exatamente qual era a sua função, de tanto que a odiava.

Namoradas, esposa, amigos, isso ele nunca teve. Um livro para ler, uma musica para ouvir, muito menos. Não possuía qualquer coisa que pudesse enriquecer sua vida. Rogério - enfim, vamos dar um nome ao pobre coitado, pelo menos isso ele merece - percebeu ainda que ele não era o único naquela situação. Compreendeu, no entanto, que ainda era possível mudar de vida, que a rotina o havia transformado em um ser alienado e insensível. Decidiu que a partir daquele dia, daria um basta e mudaria a sua vida. No dia seguinte acordou, fez a barba e foi trabalhar.

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